O papel da escola e do professor de Educação Infantil
O professor e o desenvolvimento emocional da criança pequena Ligia de Carvalho A. Vercelli (veja o texto completo)
Iniciamos este tópico apresentando os dados retirados dos relatórios de estágio realizado em salas de Educação Infantil e que também foram discutidos com os futuros professores em sala de aula.
Normalmente as professoras gritam com as crianças para que façam silêncio, reclamam muito da educação que elas trazem de casa, poucos são os momentos que as professoras demonstram atenção e afetividade.
Observamos uma professora enfurecida gritando com um aluno pequenino chamando-o de animal e tomando-o bruscamente pelo braço. Levou-o à professora de outra sala e disse: “vou deixálo em sua sala, porque ele deve ficar longe das outras crianças, ele é um animal e não uma criança”.
A maioria das professoras grita muito com as crianças, principalmente, quando estão mais agitadas. A punição para a indisciplina é deixá-los sem parque por volta de quinze minutos ou mandá-los para a sala vizinha para ficar com outro professor.
Observei professores repreendendo os alunos com gritos e xingamentos.
O professor castigava os alunos colocando-os de frente para a parede e os humilhando diante das demais crianças. A criança que desobedecia era levada para outra turma ou para a coordenação.
Para corrigir a indisciplina, a criança é posta num canto, sentada na cadeira com o intuito de neutralizar o seu comportamento.
Observamos algumas professoras da educação infantil sem a menor paciência com os pequenos, gritam demais.
O professor coloca a criança no canto da sala para pensar a isentando de realizar as demais atividades.
Um dado importante a ser apontado é que o professor regente não se intimidou com a presença do estagiário quando tomou as atitudes elencadas.
Podemos levantar várias hipóteses para explicar tais comportamentos, porém, seria leviano de nossa parte tentar entendê-los sem conhecer a trajetória de vida desse profissional. Podem ser fatores relacionados à maternagem, ou a possíveis humilhações sofridas na infância por outras figuras de autoridade etc. Seja qual for o motivo, não podemos admitir que tais atitudes se perpetuem e que nada seja feito para impedi-las em nome do bem-estar dos pequenos.
O fato é que, diante dessas situações, uma criança se sente completamente desamparada, pois como vimos anteriormente os pequenos necessitam dos pais para se identificar. São as condutas dessas figuras parentais que farão com que ela se perceba como sujeito, dado que o desenvolvimento emocional tem início no nascimento. Nesse sentido, Winnicott (1982, p. 116) afirma:
Se quisermos julgar a maneira como um ser humano trata com os seus semelhantes, e ver como se edifica a sua personalidade e vida, não poderemos dar ao luxo de deixar de fora o que sucede nos primeiros anos, meses, semanas e mesmo dias de sua vida. Quando abordamos os problemas dos adultos, por exemplo, os associados ao casamento, somos confrontados, evidentemente, por muita coisa que pertence a um período ulterior do desenvolvimento […]Muitas crianças começam a frequentar a escola por volta de seis meses de vida, assim que termina a licença maternidade da mãe. O professor assume, nesse momento, o papel que cabia à figura materna, não como substituto desta, mas como promotor de ampliação e suplementação de um papel que apenas a mãe ou quem cumpre a função materna desempenha. As crianças pequenas necessitam, em um ou outro momento, da assistência materna, por isso o professor precisa agir disponibilizando esses cuidados. Winnicott (1982) salienta que quando uma criança passa dos cuidados maternos para a escola, esta tem de continuar, na figura do professor, a propiciar meio físico e corporal à criança, fato que ecoa no desenvolvimento emocional. O dever do professor é o de manter, fortalecer e enriquecer as relações pessoais das crianças com a família e com a diversidade de um mundo repleto de pessoas e oportunidades.
A entrada na escola representa um choque para a criança, uma vez que, nos primeiros anos de vida, ela é incapaz de exercer simultaneamente três tarefas psicológicas, a saber: em primeiro lugar, estabelecer relação com elas mesmas; em seguida, com a mãe, e por último com outras pessoas.
Nesse sentido, o professor necessita perceber que ele é o objeto dessa relação pessoal não materna e que, para a criança, não é uma pessoa qualquer nem pode agir como se fosse. Ele deve “[…] aceitar a ideia de que a criança só gradualmente chegará ao ponto de cedê-la a outras crianças sem ficar perturbada.” (WINNICOTT, 1982, p. 222). Quando a criança sentir-se segura para se relacionar com outras pessoas cederá o professor para as demais, o que dependerá da natureza das experiências prévias da criança com a mãe.
O professor desempenha um papel importante na vida dos pequenos, pois, ao assumir a postura que a mãe mantinha em casa, será idealizado como alguém muito importante e fará com que a criança se sinta segura e busque novas descobertas. Ao professor cabe assumir um papel caloroso, já que de agora em diante será o principal esteio na vida da criança; cabe ser coerente em seu comportamento para com ela, discernindo suas alegrias e mágoas.
Além disso, deve ser tolerante, para que possa ajudá-la em suas necessidades. Dolto (1998, p. 21), em 1979, já assinalava que, “Hoje, os professores já não são somente pedagogos, têm de fazer uma educação que a família reduzida já não assegura e deveriam ser, mais que professores de saber, educadores para a vida pessoal de cada criança.”
As atitudes dos professores em relação às crianças pequenas, conforme apontadas neste texto, nos faz pensar no conceito de educação perversa utilizado pela autora. Para ela, “A educação perversa traz incessantemente de volta ao passado em vez de abrir constantemente para o futuro […]. É perverso orientar a educação pelo prazer que as crianças deveriam dar aos pais […]” (DOLTO, 1998, p. 21) e, consequentemente, aos professores. Percebemos que os docentes querem que as crianças ajam de forma a satisfazer as necessidades dos adultos, independentemente das manifestações próprias da idade de cada uma. Os recortes selecionados denotam a intimidação recebida dos educadores, o que angustia cada vez mais os pequenos.
Um professor na educação infantil deve ser um bom "contador de histórias"
veja: Andrew Stanton: As pistas para uma grande história